O julgamento é um desdobramento de decisão do Supremo, que em 2018, entendeu lícita a terceirização de atividade-fim, mantida a responsabilidade subsidiária da tomadora de serviços
A terceirização de serviços é uma tendência no mercado de trabalho brasileiro. No entanto, o entendimento dos Tribunais Superiores sofreu consideráveis modificações ao longo dos últimos anos.
Terceirização é a forma de subcontratação pela qual uma empresa (chamada tomadora de serviços) contrata uma outra empresa (fornecedora de mão-de-obra) que por sua vez contrata diretamente os trabalhadores que prestarão serviços para a primeira, tomadora.
É um recurso muito utilizado para baratear os custos com mão-de-obra, em especial nas empresas do ramo da construção civil.
Nestas hipóteses, de quem é a responsabilidade pelos débitos trabalhistas: da empresa que contratou, dirigiu e assalariou o trabalhador, ou é também daquela empresa tomadora que usufruiu do trabalho e com ele auferiu lucros?
Até 2018, a resposta dependeria da seguinte pergunta: a atividade que foi terceirizada é a mesma do objeto social da empresa tomadora? (Como exemplo, uma construtora que contrata uma outra construtora, ou empreiteira).
Se esta for a hipótese, estaríamos diante da famigerada terceirização de atividade-fim.
Nestas condições, o TST tinha jurisprudência consolidada na Súmula 331 no sentido de considerar esta terceirização como ilícita. Isso decorria do entendimento de que o único propósito desta forma de subcontratação seria a precarização da mão-de-obra, haja vista que se é economicamente vantajoso para a tomadora de serviços contratar trabalhadores por intermédio de outra pessoa jurídica, naturalmente se supõe que alguns dos direitos trabalhistas teriam sido sonegados pela contratada. Afinal, estaríamos falando da própria atividade principal do tomador de serviços.
A consequência neste caso seria a formação do vínculo de emprego diretamente com a tomadora de serviços e/ou sua responsabilidade solidária pelo pagamento de todas as verbas inadimplidas pela subcontratada.
A terceirização não seria considerada ilícita apenas nos casos excepcionados pela Súmula 331/TST, em seu item III: para serviços de conservação e limpeza, bem como serviços especializados ligados à atividade-meio do tomador (desde que inexistente a pessoalidade e a subordinação direta).
É o caso, por exemplo, da mesma construtora, mas que contrata uma empresa para realização dos serviços de vigilância, ou de fornecimento de refeição em suas dependências.
O que distinguia uma hipótese (i) a terceirização da atividade-meio (lícita) e a (ii) terceirização de atividade-fim (ilícita), é que no caso da primeira, a empresa tomadora responde pelos débitos trabalhistas de forma subsidiária, ou seja, caso se esgotem todos os meios processuais para a satisfação do débito da real empregadora. Outrossim, inexiste a formação de vínculo de emprego diretamente com a tomadora.
Já na segunda hipótese, de terceirização ilícita, o vínculo de emprego seria formado diretamente com a tomadora, que passaria a ser devedora solidária da obrigação. Isso significa dizer que o empregado poderia pleitear seus direitos diretamente em face da tomadora, independentemente de ter buscado a satisfação do débito junto à empresa que o contratou.
Embora dita Súmula ainda não tenha sido revista pelo TST, no julgamento de 22/02/2022 corroborou-se a tese fixada em 2018 pelo TST, que revê este posicionamento, entendendo que “é lícita a terceirização ou qualquer outra forma de divisão do trabalho entre pessoas jurídicas distintas, independentemente do objeto social das empresas envolvidas, mantida a responsabilidade subsidiária da empresa contratante”.
Na ocasião do julgamento em agosto de 2018, na ADPF 324, de relatoria do ministro Luís Roberto Barroso, a Associação Brasileira de Agronegócio questionou a constitucionalidade da interpretação adotada em decisões da Justiça do Trabalho, argumentando que o entendimento que restringe a terceirização com base na súmula 331 do TST afeta a liberdade de contratação das empresas, além de violar preceitos constitucionais fundamentais da legalidade, da livre iniciativa e da valorização do trabalho.
Barroso afirmou que as restrições à terceirização da maneira como têm sido decididas pela Justiça do Trabalho violam os princípios da livre iniciativa, da livre concorrência e da segurança jurídica, além de não terem respaldo legal. O ministro ainda salientou que o modelo flexível é uma estratégia essencial para a competitividade das empresas e afasta o argumento de precarização da relação empregatícia, que existe “com ou sem terceirização”.
O relator votou pela licitude da terceirização de toda e qualquer atividade, meio ou fim, não se configurando relação de emprego entre a contratante e o empregado da contratada. Para Barroso, na terceirização, compete à contratante verificar a idoneidade e a capacidade econômica da terceirizada e responder subsidiariamente pelo descumprimento das normas trabalhistas, bem como por obrigações previdenciárias.
No julgamento do dia 22/02/22, o TST aplicou o entendimento emanado pelo STF e definiu alguns parâmetros para o processamento dos pedidos fundados na terceirização, estabelecendo que ambas as empresa (contratada e tomadora) devem ser chamadas a responder à ação e que a decisão será uniforme para ambas.
O TST decidiu não modular os efeitos da decisão, mas passará a aplicar a nova tese ao julgamento dos casos concretos submetidos ao Tribunal.
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